INUNDAÇÕES EM ALCOBAÇA NO SÉCULO XVIII (IV) A grande cheia de 11 de dezembro de 1774

Depois do relato, por Frei Alberto de São José, da inundação de 18 de outubro de 1713, publicamos hoje a relação da segunda grande cheia do século, a de 11 de dezembro de 1774, relação essa redigida por Frei Manuel de Figueiredo, cronista dos cistercienses de Portugal (que importa não confundir com o seu predecessor no cargo, Frei Manuel dos Santos, falecido, como é sabido dos historiadores sérios, em 1740). E reproduzimos a seguir um extrato do Elucidário de Frei Joaquim de Santa Rosa de Viterbo relativo à mesma cheia.

«Na Dominga terceira do Advento, onze de dezembro de mil sete centos setenta e quatro, pelas nove horas e meia da noite, cresceu tanto o rio do Arieiro(1), que, entrando pelas abertas aonde não havia casas, e pelas portas das mesmas casas, as inundou em altura de quatro, sete e nove palmos e meio, defronte da portaria de baixo, e, no interior da portaria, oito palmos.
No meio do Rossio, seis palmos, o que se viu pelo mastro das festas de Santo António. Continuou a inundação pela Praça em altura de sete palmos, e, voltando à rua da Levada, se foi ajuntar com o outro rio à ponte da Conceição.
O rio de Chaqueda subiu doze palmos na superfície da Cerca, aonde levou o muro e guardas da ponte que está na extremidade da Cerca de dentro, e, de fora, subindo no cunhal do Dormitório novo altura de sete palmos e meio, e à porta da Aula sete palmos e meio, e à porta da tulha sete.
As águas do Cidral inundaram a Rua de baixo em altura de sete palmos. Em todas as casas inundadas arrebataram as águas os móveis de seus habitadores, e perderam os que não levaram.
Depois de unidas todas as águas, derrubaram a ponte de D. Elias, com cento e dezasseis anos de idade (2). Não cabe, na brevidade desta memória, relatar os estragos que padeceram esta Vila e suas vizinhanças em casas, moinhos, pontes, paredes, terras e arvoredos.
Foi preciso romper um monte para encanar as águas para os moinhos, cozinha e mais oficinas do Mosteiro, por haver a mesma cheia destruído a antiga corrente das mesmas águas, impossibilitando todo o conserto (3).»

Extrato do Elucidário de Fr. Joaquim de Santa Rosa de Viterbo:
«Em a noite de 11 de dezembro de 1774, houve em Alcobaça uma inundação pasmosa e nunca dos seus habitantes lembrada; fez horrorosos estragos em homens, animais, paredes, pontes e caminhos. Junto à ponte que vai para Leiria, que inteiramente destruiu, apareceram em cavernas profundíssimas muitas medalhas e dinheiros antigos, além de muitas pedras e metais que pareciam queimados com fogo de enxofre… (4)»
(Continua.)

(1) Rio do Arieiro era o nome que davam ao rio Alcoa «antes que se despenhe no rio Baça […], junto à casa antiga da Câmara e ponte da Praça», escreve Frei Manuel de Figueiredo na sua História Cororográfica da Comarca de Alcobaça (1781), BNP, códice 1492, f. 94.
(2) Esta ponte havia sido reconstruída, pois, em 1658, não se conhecendo a data exata do seu anterior derrube.
(3) Extraído de: Fr. Manuel de FIGUEIREDO, in Índice do Cartório de Alcobaça, Arquivos Nacionais / Torre do Tombo, Mosteiro de Alcobaça, livro 213, f. 447v.
(4) Elucidário das palavras, termos e frases que em Portugal antigamente se usaram e que hoje regularmente se ignoram [1798], ed. Mário FIÚZA, Porto, 1983, vol. I, p. 323, s. v. «ALCOBAXA ou ALCOBACHA».

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