Michael Nnadi: 18 anos

Nos anos 90, conheci dois padres do Ruanda. Um não tinha notícias da família há muito tempo, outro acabava de saber que todas as pessoas da sua família –avós, pais, irmãos, tios e primos– tinham sido mortos por pertencerem a uma tribo católica. Aquele que não recebia qualquer contacto há muito tempo suspeitava de que a razão é que toda a sua família também tinha sido chacinada e provavelmente a aldeia inteira. Os dois padres sobreviveram por estarem a estudar na Europa. Recordo-me das conversas, do perdão, da confiança em Deus que transforma as calamidades mais tristes em força de vida.
Em momentos de tragédia muito forte, a vida ilumina-se com uma luz que põe em causa muitas perspectivas anteriores. De repente, os pequenos objectivos perdem relevo, diluem-se as pequenas contrariedades, as pequenas curiosidades, as pequenas circunstâncias e avultam os grandes ideais. Estes abalos despojam a pessoa dos apegos não muito pensados, nem muito queridos, que se vão colando insensivelmente à vida. Jesus falou do efeito devastador destes caprichos minúsculos e da esterilidade que produzem: “Ouvi o significado da parábola do semeador. (…) O que recebeu a semente entre espinhos é aquele que ouve a palavra, porém os cuidados deste mundo e a sedução das riquezas sufocam a palavra e ela fica sem fruto” (Mt 13, 18.22).
As sucessivas notícias chegadas nestes últimos dias da Nigéria recordam aquela purificação dolorosa da igreja católica do Ruanda a que me referi acima.
A 8 de janeiro, quatro seminaristas nigerianos – Pius Kanwai, 19 anos; Peter Umenukor, 23 anos; Stephen Amos, 23 anos; e Michael Nnadi, 18 anos – foram raptados. Dez dias depois, o primeiro foi libertado, com muitas feridas. A 1 de fevereiro, foram libertados mais dois seminaristas e, no dia seguinte, chegou a notícia de que o mais novo, Michael Nnadi, tinha sido torturado e morto. Da Nigéria, continuam a chegar notícias: “Outros se preparam para servir Deus. Mais gente está a chegar ao seminário para serem padres e pregar o Evangelho como Cristo nos mandou”.
Um jornalista recolheu as impressões, a quente, de um seminarista africano de nome Lenine Mudzingwa: “Pondo-me na pele deles, eu ficaria muito aflito. Ficaria aterrorizado. Viver numa situação tão ameaçadora tira a esperança, desalenta. Mas, por outro lado, eu rezo e estou convencido de que esta situação dá mais coragem para seguir o caminho deles e dar a vida pelo Evangelho”.
Para todos, a vida é uma luta. Não com armas de violência, mas com um despojamento radical e um amor entregue até ao último suspiro. A quem não percebeu isto, e anda distraído com caprichos que não valem nada, Jesus disse claramente: “O reino dos céus é tomado pela violência e são os violentos que o arrebatam” (Mt 11, 12).

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