Quem aponta a Luz do Mundo?

No século XVI, a descoberta do alçapão de entrada para umas catacumbas esquecidas, na via Salaria, ofereceu à Igreja um olhar novo sobre a comunidade cristã dos primeiros séculos. Foi o frade Alfonso Ciacconio quem primeiro se adentrou pelos quilómetros e quilómetros de labirintos estreitos destas catacumbas, em três níveis sobrepostos, escavados no subsolo da cidade de Roma. A capital do antigo Império Romano já conhecia muitas catacumbas, mas estas são particularmente importantes.
Numa das muitas capelinhas destas catacumbas, hoje conhecidas como catacumbas de Santa Priscila, existe um fresco com a imagem de Nossa Senhora com o Menino. Os primeiros que exploraram este mundo novo compreenderam imediatamente a raridade do achado: este fresco é a mais antiga representação de Nossa Senhora que chegou até nós.
Em 1992, as intervenções de limpeza e consolidação do fresco, permitiram datá-lo com rigor, entre os anos 130 e 140 depois de Cristo. Alguns outros frescos da mesma zona, de tema cristológico, também são desta data, nomeadamente a imagem de Cristo Bom Pastor, com uma ovelha aos ombros. Em paredes próximas, há representações pintadas por volta do ano 160, durante os anos mais terríveis da perseguição de Diocleciano.
Neste fresco, por cima da figura de Maria com o Menino, situa-se uma estrela e, ao lado de Nossa Senhora, uma figura masculina, de pé, a apontar a estrela. Desde o princípio, essa personagem foi identificada como S. José, atribuição que prevaleceu até ao século XIX, quando começaram a multiplicar-se as teorias. Ninguém se lembraria de pintar S. José num presépio! Concluiu-se assim que o homem a apontar a estrela deveria ser um profeta do Antigo Testamento, a indicar com o gesto que o Messias seria a Luz do Mundo. É essa, hoje, a convicção dos especialistas.
Seguindo este raciocínio, Giovanni Battista de Rossi concluiu que era Isaías. Pelo contrário, Raffaelle Garrucci pensou que seria Balaão. Joseph Wilpert voltou a Isaías, mas depois considerou que afinal seria Miqueias. Giorgio Otranto pensou que seria o Rei David. As hipóteses sucedem-se. Chegados a este ponto, as alternativas parecem esgotadas, para quem sonhe em imortalizar o seu nome com uma hipótese original. Que pena, não sermos nós a descobrirmos quem acompanha a mais antiga imagem de Nossa Senhora. Decerto ficaríamos célebres e talvez ricos. Porque é uma imagem a vários títulos invulgar. Uma imagem simultaneamente arcaica e cheia de movimento, com o Menino irrequieto a saltar do colo da Mãe. Uma imagem com o sabor do tempo dos Mártires, que morreram confiantes em que o Jesus Menino vale mais que o Imperador.
Já se exploraram todas as alternativas. Nesse caso, prefiro a solução dos que primeiro entraram nesta catacumba, que vigorou indiscutida durante três séculos: é S. José quem está junto de Maria e do Menino.
Por mim, está decidido. É S. José quem aponta a Luz do Mundo nas catacumbas de Priscila. Por alguma coisa, o Papa dedicou este ano ao santo Patriarca.

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