Books & Movies, uma crise de identidade

José Alberto Vasco
Escritor

Outubro assinalou mais uma edição do Books & Movies, exteriorizando novamente os problemas de identidade que sempre o perturbaram.
A coincidência de datas com o Folio – Festival Literário Internacional de Óbidos contribuiu marcadamente para evidenciar a significativa diferenciação programática entre os dois eventos, convocando mais uma vez a localizada marginalidade do festival alcobacense e a relevância nacional do festival obidense, sendo essa decisiva especificação acima de tudo timbrada pela quase ausência de livros no de Alcobaça e pela proeminência dos mesmos no de Óbidos.
Essencial na qualidade desde sempre assegurada pelo Folio tem sido a sua indiscutível identidade literária, enquanto em Alcobaça nunca se decidiu bem se optáramos por contextualizar um festival literário ou um festival cinematográfico, adulteração criativa cuja mais marcante insinuação negativa tem sido um inócuo prémio de cinema entretanto excomungado.
Alcobaça invoca uma paradigmática herança em termos de organização de feiras do livro, sendo desse facto elogiável e inesquecível a de 1972, em que além do envolvimento das mais influentes editoras nacionais, incluindo mesmo a estreia nacional de suas edições, se conjugou a deliberação prioritária pelo livro com atividades correspondentes, como palestras, colóquios, conferências, leitura ao vivo e concertos, sempre com absoluto predomínio para a produção literária, não tendo mesmo faltado a então audaciosa venda de livros proibidos depois da meia-noite nas traseiras dos pavilhões.Foi desse respirar literatura que um acontecimento como o Folio emergiu, desvendando também esse desafio no sempre auspicioso contacto com escritores de craveira internacional, incluindo alguns dos galardoados com o Nobel da Literatura.
O Books & Movies continua distante desses pergaminhos, pecando pela falta de algo que no mínimo se pareça com uma feira do livro e preferindo apostar em espetáculos de duvidosos resultados literários, pois Alcobaça continua a ser quase um deserto em termos de livrarias abertas ao público. Não nos basta que o nosso Presidente da Câmara se fantasie de Vereador da Cultura, pois a tradição cultural alcobacense exige muito mais, inclusivamente conhecimento e investimento entendido, o que neste caso passa substancialmente pela erudição de evitar cenas inoportunas como a de ele mesmo ter anunciado a exibição num futuro próximo do novo e literariamente adequado filme de Edgar Pêra no mesmíssimo cineteatro em que decorreu uma equívoca gala de encerramento de um festival a que nada acrescenta em termos de qualificação programática.

José Alberto Vasco
Escritor

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