Ulmowie, uma família inteira

José Maria André
Professor do I. S. Técnico

Os apelidos polacos têm muitas flexões, conforme se aplicam ao marido, ou à mulher, ou à família inteira. Escrevendo em português, podemos ficar com a raiz do nome, que é Ulm, sem distinguir entre os vários elementos da família ou o seu apelido conjunto, Ulmowie.

Este Domingo, 10 de Setembro, em Markowa, na Polónia, vai dar-se pela primeira vez na história a beatificação de uma família inteira, pais e filhos, incluindo um bebé não nascido.

Este facto tem grande significado porque, em geral, cada pessoa santifica-se, ou condena-se, por aquilo que faz, independentemente dos que a rodeiam, e por isso cada santo também é canonizado individualmente. Salvo as crianças, que têm um estatuto especial.

Quem foram os Ulm?

Embora vivessem numa grande aldeia da Polónia, Józef e Wiktoria tinham estudos, falavam línguas estrangeiras, possuíam uma boa biblioteca. Casaram em 1935. Em 9 anos de casados, tiveram seis filhos, Stasia, Basia, Władzio, Franuś, Antoś, Marysia e em 1944 Wiktoria esperava o sétimo. Eram um casal enamorado. O pai, Józef, produzia fruta, legumes, era apicultor, criava bichos da seda para fazer tecidos e era o fotógrafo da localidade. Por isso dispomos de tantas fotografias da família. A mãe, Wiktoria, interessava-se por literatura, fazia teatro numa companhia amadora, estudava na Universidade. Todos esses interesses e actividades, mais os filhos, com idades em escadinha, garantiam uma vida preenchida naquela casa, inspirada por uma fé simples e autêntica.

Em 1942, em plena Segunda Guerra Mundial, os Ulm esconderam oito pessoas lá em casa, a família judia Goldmann, perseguida pelos nazis. As crianças Ulm e Goldmann brincavam juntas, as famílias partilhavam preocupações e alegrias e os judeus adultos ajudavam como podiam, sem sair do esconderijo. Os vizinhos testemunhavam o rebuliço feliz daquela convivência, apesar dos apertos e das ameaças. Assim passaram quase dois anos.

Os Ulm sabiam que se arriscavam à pena de morte por esconderem judeus. Para mais, uma família judia escapada aos nazis com a ajuda de um polícia polaco, a quem tinham confiado as suas posses em custódia. Quando quiseram reavê-las, o polícia quis ficar com tudo, de modo que os judeus resolveram impor-se e, a seguir, o polícia vingou-se, procurando-os e denunciando-os. Nada disto merece ser lembrado. Nem sequer a crueldade dos nazis, que no dia 24 de Março de 1944 mataram os pais de forma bárbara à frente dos filhos e depois mataram os filhos. E mataram também todos os judeus que viviam com eles.

O que a Igreja não esquece é a fé dos Ulm, a sua «santidade do dia-a-dia», como diz o Papa. Neste caso, a sua santidade foi constituir uma família feliz e generosa, cheia de interesses, cheia de vida, rodeada de amizades, carregada de trabalho e de interajuda, vibrando com uma fé simples e prática.

É a primeira vez que uma família inteira é beatificada e esta é a primeira beatificação de um bebé não nascido, que nem chegou a ter nome. Os laços familiares são tão importantes que a Igreja baptiza as crianças pequenas na fé dos pais. Porque os filhos crescem na fé dos pais, na generosidade dos pais. Com esta beatificação excepcional, a Igreja quer recordar esta mensagem, lembrando a todos os casais a sua responsabilidade. Os filhos pequenos são santos se os pais são santos.

Exceptuando os chamados Santos Inocentes — os bebés chacinados pelo Rei Herodes com o intuito de matar o Messias à nascença —, nunca se tinham beatificado crianças tão pequenas. Também sob este aspecto, a cerimónia chama a atenção, por sublinhar o valor dos pequeninos.

Este simbolismo é reforçado porque o martírio ocorreu na véspera do 25 de Março de 1944, festa da Anunciação do Anjo a Nossa Senhora — e portanto festa da Concepção de Jesus por obra do Espírito Santo. O dia 25 de Março tem particular ressonância na Polónia, porque é o Dia da Vida Nascente, em honra da dignidade humana, mesmo dos mais pequeninos e dos ainda não nascidos.

José Maria André
Professor do I. S. Técnico

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