Livro do Papa “Contra a Guerra”

José Maria André
Professor do I. S. Técnico

Esta semana, na Quinta-feira Santa, saiu um novo livro do Papa, intitulado “Contra a Guerra. A Coragem de Construir a Paz” (título original em italiano: “Contro la guerra. Il coraggio di costruire la pace”).

Além de Encíclicas, Exortações apostólicas, Cartas Pastorais, Mensagens, Bulas, etc., os Papas, desde João Paulo II, começaram a publicar livros. A diferença do formato não diz respeito ao número de páginas, porque há documentos papais com duas centenas de páginas, mas na índole pessoal do texto e também no desejo de chegar a um público mais amplo, além dos confins da Igreja católica.

Diversos livros atribuídos aos Papas são apenas colectâneas de discursos, seleccionados tematicamente por algum colaborador. Só em língua italiana, já há meia centena de livros deste tipo atribuídos ao Papa Francisco, sem contar com os volumes oficiais que publicam todas as suas intervenções de cada ano. O novo livro retoma intervenções conhecidas, mas é mais que uma colectânea de textos.

Não é o primeiro livro do Papa Francisco a pedir a paz. Há quase um ano, saiu “Paz na Terra. A Fraternidade é Possível” (“Pace in terra. La fraternità è possibile”, no título original), com prefácio do Patriarca copto-ortodoxo Tawadros II. Ainda assim, o novo livro está a ter um grande impacto, pela proximidade da guerra na Ucrânia e o apelo particularmente forte e angustiado ao fim da guerra.

Uma das ideias-chave do anterior livro de Francisco sobre a paz pode ser resumida em duas citações: “a indiferença é cúmplice da guerra” e “a paz e a fraternidade são possíveis”. Uma das teses principais do novo livro é que “a guerra não é solução”.

Parece-me que há um fio condutor entre as duas obras. No primeiro livro, o Papa afirma que não podemos alhear-nos dos horrores da guerra, como se não tivéssemos responsabilidade pela paz. Francisco chega mesmo a dizer que os políticos que fugirem à responsabilidade “hão-de prestar contas a Deus”. Neste segundo livro, insiste-se em que alimentar a guerra em vez de acabar com ela não é solução.

A meu ver, esta posição contrasta com a atitude de boa parte da comunidade internacional que, em vez de parar o agressor, fornece armamento aos ucranianos para que eles se defendam como puderem. É sem dúvida mais cómodo, mas o resultado é uma guerra de atrito com numerosas mortes de ambos os lados, principalmente entre os mais vulneráveis.

No meu ponto de vista, o mínimo que os países livres podem fazer pela Ucrânia é ajudá-la com armas. No entanto, esse mínimo é insuficiente, porque já produziu muitas dezenas de milhares de mortos entre a população ucraniana, milhões de refugiados que tiveram de fugir para o estrangeiro e milhões de famílias divididas. É verdade que também morreram milhares de militares da força invasora, mas essas baixas são pouco visíveis num regime ditatorial e não chegam para a Rússia desistir da “operação especial”.

A dificuldade da comunidade internacional em conseguir a paz na Ucrânia deve-se principalmente àqueles países que se opõem à democracia, como é o caso das ditaduras comunistas (chinesa, cubana, norte-coreana e venezuelana) e de alguma democracia disfuncional (em particular a indiana). Embora estes regimes julguem tirar vantagem da desgraça alheia, a invasão prejudica o mundo inteiro e atinge-os especialmente a eles, mesmo que os seus dirigentes não se dêem conta. O turismo internacional e os intercâmbios comerciais e culturais estavam a promover a fraternidade universal e a valorizar os méritos próprios de cada cultura. Ajudavam os povos ainda sem liberdade a abrir-se ao valor da paz e da harmonia social. A interdependência económica e cultural era uma oportunidade para o desenvolvimento dos mais pobres, em espírito de cooperação pacífica.

Depois da invasão da Ucrânia, os países livres reagiram limitando a sua dependência em relação a regimes inseguros e reforçando as defesas militares, para não serem os próximos alvos. Por um lado, é uma pena que se perca a oportunidade de estreitar os laços de cooperação internacional, que poderiam produzir frutos de amizade e paz a longo prazo. Por outro, o investimento na defesa, que me parece prudente nas circunstâncias actuais, desvia-se nalguns casos para armas de destruição das cidades, em lugar de armas de defesa do próprio país. O Papa Francisco critica directamente esta estratégia de ameaçar populações civis, porque não é eficaz para conter agressões e, em vez de limitar a guerra, estende o seu potencial de extermínio a toda a humanidade.

É cada vez mais claro que o Concílio Vaticano II tinha razão ao proclamar que compete à comunidade internacional assegurar a paz e não é saudável que cada país tenha a sua própria força armada. De momento, ainda há demasiados países subjugados por ditaduras belicistas, mas não podemos desistir de construir um mundo mais fraterno, em que não seja preciso cada um armar-se contra os outros e a comunidade internacional tenha a capacidade de impedir as agressões.

O Presidente do Cazaquistão anunciou a visita do Papa ao país no próximo mês de Setembro e a Santa Sé já confirmou a viagem. João Paulo II decidiu ir ao Cazaquistão 11 dias depois do atentado às Torres Gémeas, apesar de ter sido durante muito tempo uma colónia soviética e ter uma maioria muçulmana. Francisco também aposta na inteligência dos cazacos, para serem mediadores de paz entre mundos em conflito.

José Maria André
Professor do I. S. Técnico

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